Eu tenho vergonha das minhas origens desonrosas e das suas inúmeras versões tenebrosas.
Tudo arde por debaixo do tapete empoeirado.
Pai ausente e mãe adolescente são o retrato de uma base que me faz tão mal.
O bebê absorve as carências da existência,
a menina dribla as sombras insistentes,
a adolescente ri, no alto da sua arrogância, dos medos da sua infância.
A jovem pressente sem poder nomear os maus-tratos
e tenta dar sentido ao incompreensível.
A jovem mulher desbrava o percurso,
a mãe chora a morada vazia.
A mulher de quarenta mergulha no indizível e se reconhece finalmente falível.
O véu cai, as máscaras também.
Não vejo a hora de encontrar a mulher de 50, de 60, de 70 e assim por diante,
pois pressinto o tempo como meu maior aliado nesse meu reinado interior.
Do bebê à anciã, rodamos na ciranda da vida com muita gratidão envolvida.
Ariella Machado
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